Atualmente acolhidas em Rio Preto, as irmãs Josie, 50 anos, e Naika Floriste, 22 anos, que nasceram no Haiti, tiveram que deixar o país caribenho para escapar da violência que assola as ruas de Porto Príncipe. Além das duas, a matriarca, irmãos e sobrinhos de ambas rumaram para a Venezuela, após o assassinato do pai, com o auxílio de uma organização religiosa.
Depois de um tempo em Caracas e arredores, chegaram no Brasil, nação que sempre teve um papel pioneiro e de liderança na proteção internacional dos refugiados, segundo o escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), da Organização das Nações Unidas (ONU). Em 1960, foi o primeiro país do Cone Sul a ratificar o Estatuto dos Refugiados (Convenção de 1951), da ONU.
Neste ano, o Dia Mundial do Refugiado – celebrado em 20 de junho – se concentra no poder da inclusão e nas soluções para as pessoas refugiadas, sob o tema: “Esperança longe de casa: por um mundo inclusivo com as pessoas refugiadas”.
“No Brasil é muito melhor, porque consegui trabalho e, com isso, posso dar comida para os meus filhos. Eles estudam e se alimentam, sem problema”, diz Josie em uma fala que mescla português e espanhol. Seus filhos, Joselina e Henry Junior, são adolescentes e nasceram na Venezuela, por isso não vivenciaram os horrores do Haiti.
Antes de chegar a São José do Rio Preto, Josie morou em Belo Horizonte. Em outras cidades, trabalhou com o que mais gosta de fazer: cozinhar! Por aqui, já ocupou vários postos e atualmente busca nova inserção no mercado de trabalho. “Por meio da comida eu mantenho os laços com minha terra, minha cultura. Lá (no Haiti), a gente come arroz com feijão misturado, mas é diferente daqui, pois é feito tudo junto. Aí, coloco também algum legume e carne. Meus filhos adoram”, conta.
Ela gostaria de voltar um dia para o Haiti, mas não por enquanto. A ONU expressou preocupação com a escalada da violência das gangues pelas ruas do país, com aumento dos assassinatos e sequestros. Mulheres são frequentemente vítimas de crimes sexuais. “Não tenho palavras para expressar o quanto eu me sinto acolhida no Brasil”, revela Josie, emocionada.
Acolhimento
Além de outros órgãos públicos, ONGs e instituições religiosas, como a Rede Refúgio, ligada à Igreja Presbiteriana Independente de São José do Rio Preto, o acolhimento passa pela Secretaria da Mulher, Pessoa com Deficiência e Igualdade Racial de Rio Preto.
O desafio é inserir os estrangeiros nas comunidades de destino, proporcionando-lhes segurança e dando-lhes suporte para que possam recomeçar a vida com dignidade e contribuir para a sociedade, assim como prepará-los para voltar para casa e auxiliar na reconstrução de seus países, caso desejarem.
“Após atendimento na Rede Refúgio, os imigrantes e refugiados chegam ao nosso departamento. Aqui, eles recebem orientação em relação a suas demandas. Também trabalhamos a questão da empregabilidade, fazendo o encaminhamento ao mercado de trabalho, pois eles podem ser contratados com todos os direitos garantidos pela legislação trabalhista brasileira”, afirma a psicóloga Márcia Grassiano, responsável pelo Departamento de Promoção da Igualdade Racial (Depir). Apesar disso, há casos de exploração de trabalhadores estrangeiros e a rede de acolhimento pode intervir.
Juventude
Naika é mais expansiva do que a irmã e já compreende e se expressa com mais desenvoltura na Língua Portuguesa. Deixou o Haiti ainda criança e, assim como a irmã, viveu por um tempo na Venezuela. Atualmente, trabalha com embalagens, mas pretende formar-se médica.
“Sempre gostei de ajudar, desde pequena, principalmente quando as pessoas estão doentes, ou com dor. Eu me interesso pela área da saúde”, conta a jovem, que terminou a educação secundária (equivalente ao Ensino Médio) na Venezuela. Do Haiti, sente falta da comida e dos amigos e primos que deixou na ilha.
Ao ser indagada sobre qual mensagem deixaria para jovens refugiados ao redor do mundo, Naika não titubeia: “É difícil sair do lugar que mais se ama, né? Um lugar onde nós crescemos, por causa de problemas, de conflitos governamentais. Mas tem de arrumar coragem para sair e seguir em frente. O mais importante é ter Deus no coração, para poder sobreviver neste mundo”.
Segundo dados da Acnur, no final de 2022 havia 108,4 milhões de pessoas deslocadas à força em todo o mundo, como resultado de perseguição, conflito, violência, violação de direitos humanos ou eventos que perturbaram gravemente a ordem pública.